quinta-feira, 24 de novembro de 2011

A despedida de Sam












Revejo isto, a cena final de Pat Garrett & Billy the Kid e lembro-me que há muito mais que dureza, violência e brutalidade no cinema de Peckinpah. Quais controvérsias, quais abusos, quais escândalos? A despedida crepuscular do americano ao oeste é das coisas mais tocantemente líricas que já se puseram em película. Percepção triste de que é tempo de partidas, de despedidas, de que se calhar não podemos mais ser os mesmos por causa disso, de que os 'tempos' não ajudam.. de que é coisa que ultrapassa o próprio western, é a vida das pessoas..

Veja-se outra vez Pat Garrett, no cumprimento do dever, a olhar-se ao espelho e a ter a consciência que morreu. Foi-se lhe o espírito e esvaiu-se lhe a alma, num só tiro. O olhar, partido, o orgulho, ferido, a humanidade, desfeita. Percebeu que com Billy partiu o último reduto de um oeste livre, a última fronteira, o último pôr-do-sol. Filmar isto com esta consciência é fodido, é mesmo muito complicado. Cada plano dessa cena final, uma despedida, com uma frontalidade e uma graça inabaláveis. Os passos, pesadíssimos, a cabeça, baixa. Pedras a atingi-lo ao alcançar o nascer do sol. Só se pode descrever, porque não se explica, vê-se, sente-se..

Jesus! Oh, Jesus..

Fala-se de poética e beleza para outras coisas, de Tarkovski de Ozu, de Erice, usem-se também essas palavras para isto, para o momento em que Sam foi tão humano quanto uma pessoa pode ser, para o momento em que a sensibilidade falou mais alto, para o momento em que o cowboy olhou as nuvens e percebeu que estava na hora de morrer, com o passado, o presente e o futuro em perspectiva plena.

1 comentário:

João Palhares disse...

*de como westerns em sala e em película são coisas de outro tempo, também..